Não é crítica: "Cabras - cabeças que rolam, cabeças que voam”

A Cia Teatro Balagan visitou a minha cidade, Campinas. “Cabras – cabeças que rolam, cabeças que voam” é um espetáculo que muitos viram e que dispensa elogios ao texto, ao cenário, ao figurino, à música, à encenação. Porém, ontem, algo chamou minha atenção especialmente: o trabalho dos atores.

Sou suspeito para falar porque sou irmanado nas dificuldades e aprendizados deste projeto artístico com esta diretora, a Maria Thais. De qualquer modo, fiquei comovido. Porque, em “Cabras…”, os atores partem de uma certa recusa em narrar a si mesmos, narrando humanidades muitas – inclusive humanidades “não humanas” (uma bala de revolver, uma cabra, um cachorro…). Espantosamente, porém, ao se colocarem neste jogo de alteridade (“eu”, como ponta de uma lança, em busca de um “outro”; “eu” em tensão com um “outro”) deixam escapar, quase que sem perceber, algo de si. É ou não uma alegria que o teatro nos liberte de nós mesmos para, enfim, nos revelar? 

Não me refiro à revelação das intimidades de quem atua, a sua biografia, os seus segredos. Falo de outra coisa. O que se revela é um ponto de vista – ou uma perspectiva, como provavelmente a Maria Thais gostaria de dizer. Se “teatro” é “o lugar de onde se vê”, os atores da Balagan lembram que não apenas fazem ver, mas eles mesmo olham: a coisa narrada e (um espanto!) os próprios espectadores. Uma inversão e embaralhamento de perspectivas que, “caleidoscopicamente”, não encerra significados, multiplica sentidos e comemora encontros.

Sempre que assisto a atores assim, em festa, volto para casa orgulhoso do ofício que escolhi e para o qual espero que eu seja vocacionado. A Cia Balagan visitou a minha cidade. Viva!