Cotas e a universidade do século XXI

Jair Bolsonaro, que quer reduzir a política de cotas em instituições de ensino no Brasil, não para de dar motivos para votar em Fernando Haddad.

A minha experiência de pós-doutoramento na Goldsmiths University of London veio reforçar a minha convicção da necessidade de políticas públicas de estímulo à diversidade. Na aula de Teatro Africano Contemporâneo, somos doze estudantes com seis diferentes nacionalidades: além dos britânicos, há nigeriano, grega, indiana, estadunidense e, claro, eu que sou brasileiro. Somos diversos, pensamos diversamente e temos sotaques diferentes para nos expressarmos.

Desta diversidade, vão emergindo formas de saber. Não há verdades universais. Há acolhimento e escuta. Cada um de nós parece ocupado não somente do dizer, mas também do como dizer. Assim, não falamos apenas para reafirmar as nossas certezas, mas para ver como as nossas palavras se realizam em outras pessoas.

Na fricção de experiências, vejo o mistério do conhecimento. Lanço ao mar palavras escritas em cartas que estão dentro de garrafas. Deste modo, pergunto: existo? Como por milagre, o outro não apenas encontra estas incertas pistas sobre mim, como também responde: existismos!

No curso interdisciplinar sobre “Decolonização de métodos de pesquisa”, que é oferecido a alunos de todos os programas da Goldsmiths, a docente lembra a todo momento: no século XXI, desenvolver pesquisa pressupõe perguntar: o que é conhecimento? Quem está legitimado a determinar o que é conhecimento? Em que termos podemos fazê-lo? Lembre-se: estou no Reino Unido, sem dúvidas, capitalista e de história como metrópole nas relações coloniais.

A política de cotas, penso, contribui para a constituição de uma diversidade equivalente a esta que acabo de relatar. Certamente, esta ação favorece a correção de distorções de um processo histórico excludente. Além disto, constrói uma outra universidade. Assim, tanto quanto ajudar a ressignificar o passado, as cotas fomentam a construção do saber do futuro.